sexta-feira, 10 de outubro de 2025

O Grand Ring e o Valor da Arquitetura como projeto e legado

 A maior estrutura de madeira do mundo marca a Expo 2025 e levanta discussões sobre o papel simbólico e estratégico da arquitetura em grandes eventos.




A Expo é um evento importante no calendário mundial, abrangendo as mais diversas áreas do conhecimento. Para a arquitetura, interiores e construção, ela funciona quase como um balizador das ideias e conceitos que moldam — e moldarão — nosso futuro próximo.

O Japão, país-sede, já se destaca com o projeto de Sou Fujimoto: o Grand Ring, estrutura que também faz parte do master plan do evento. O Grande Anel foi construído predominantemente com cedro japonês, cipreste e pinheiro silvestre, ressaltando o valor simbólico dessa mistura entre materiais nativos (70%) e estrangeiros. Seu diâmetro externo atinge 675 metros (615 m na face interna) e cobre uma área de mais de 61.000 m², tornando-se a maior estrutura arquitetônica de madeira do mundo. A construção combina métodos modernos com a técnica tradicional “nuki”, utilizada em santuários e templos japoneses. 

A madeira vem ganhando espaço na construção civil — inclusive em edifícios de múltiplos andares —, especialmente no Japão, onde hoje cerca de 90% das casas unifamiliares são feitas com estrutura de madeira.





  

A Expo 2025 tem sido alvo de elogios e críticas. O Grand Ring, por exemplo, foi amplamente reconhecido por sua ambição, mas também criticado pelo alto custo (¥235 bilhões no total do evento), além da falta de áreas sombreadas e de materiais adequados para o clima local. Outra grande discussão é o que será deste projeto ou seus materiais aptos o fim da Expo.

O Pavilhão do Brasil também gerou controvérsias. O primeiro lugar no Concurso Nacional para o Pavilhão Brasileiro na Expo Osaka 2025 ficou com o Studio MK27/Magnetoscópio, de São Paulo. No entanto, a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), responsável pela obra, considerou o valor orçado elevado demais e apontou riscos de não concluir o projeto a tempo. Segundo Dantas e Kogan, a proposta estava dentro dos R$ 25 milhões previstos no edital, já com construtora licitada. Como não havia tempo hábil para um novo concurso, a curadoria foi entregue a Bia Lessa.

A Expo 2025 segue até 13 de outubro, mas os números já indicam um desinteresse do público, com a venda de ingressos ficando cerca de 30% abaixo do esperado.

Nesse dilema, é importante que as críticas considerem também o valor do projeto arquitetônico — e não apenas os custos de execução. Afinal, na Expo, a arquitetura dos pavilhões é a responsável por “vender” a imagem de um país. São esses espaços que comunicam ideias, valores e visões de mundo, e que permanecem na memória dos visitantes.

Um bom exemplo disso é o Pavilhão de Barcelona, projetado por Ludwig Mies van der Rohe e Lilly Reich para a Exposição Internacional de 1929. Ícone da arquitetura moderna, o pavilhão é celebrado por sua simplicidade, uso inovador de materiais e continuidade espacial. Reconstruído na década de 1980, tornou-se um marco arquitetônico e um destino turístico permanente — além de seguir influenciando gerações de arquitetos.

Por isso, investir em arquitetura e design não é apenas justificar um custo: é deixar um legado.

projeto: Studio MK27/Magnetoscópio, de São Paulo

Projeto: Bia Lessa.

Matéria publicada originalmente na Revista MixDesign 84

quinta-feira, 7 de agosto de 2025

Arquitetura Discreta, Luxo Absoluto. Quando o traço se torna desejo e o espaço, identidade. por: Alvaro Guillermo

 Arquitetura Discreta, Luxo Absoluto.

Quando o traço se torna desejo e o espaço, identidade.

Alvaro Guillermo

O mercado de luxo deixou de vender apenas produtos há muito tempo. Hoje, ele entrega experiências, narrativas e atmosferas. Nesse cenário, a arquitetura se revela como um dos ativos mais estratégicos e simbólicos. Em um mundo saturado por imagens e repetições, o espaço construído ainda tem o poder de ser único, memorável e, acima de tudo, desejável.

No luxo, a arquitetura é branding, porque reforça a identidade e apresenta a marca de forma rápida e eficaz:

  • arquitetura comunica valor simbólico: tempo, cultura, autoria.
  • cria cenários de exclusividade: irrepetíveis, singulares.
  • transforma marcas em experiências sensoriais, emocionais e imersivas.

A arquitetura também revela os desejos e os modos de vida das pessoas — seus anseios concretizados em três dimensões. Por isso, observamos uma mudança significativa nas escolhas para os ambientes: uma preferência crescente por propostas mais clean”, essenciais e autênticas.

O luxo silencioso: quando menos é muito mais.

A arquitetura pode ser a própria definição de luxo — sem ostentação, mas com sofisticação visceral.

Aman Tokyo (Japão) interiores da empresa Kerry Hill Architects, com Luxo minimalista inspirado nos templos japoneses é um grande exemplo. A luz, os materiais naturais e o silêncio criam uma experiência quase espiritual.





Villa Vals (Suíça) da SeARCH & CMA Architects é uma casa escondida na montanha, quase invisível na paisagem, mas deslumbrante por dentro. Um exemplo de luxo integrado à natureza.




Andronis Suites (Grécia) da kapsimalis architects Suítes cavadas nas falésias de Santorini, reinterpretando a arquitetura vernacular com sofisticação. O luxo está na vista e na paz.




Casa das Canoas (Brasil) de Oscar Niemeyer, ícone da brasilidade modernista. Ainda subexplorada como ativo de luxo nacional.



Uma oportunidade para o Brasil. Com uma tradição arquitetônica ímpar — do modernismo  e brutalismo às expressões vernaculares — o Brasil possui um capital simbólico extraordinário. Falta apenas convertê-lo em estratégia de marca, produto e narrativa.

Neste sentido a Arquitetura com bons projetos gera posicionamento, que é essencial para as marcas. É hora de tratá-la como vetor de diferenciação no mercado de luxo — nacional e internacional. A linguagem dos desejos torna arquitetura como reflexo de novos modos de viver.

O verdadeiro luxo não grita — ele sussurra com elegância.

Em tempos de repetição e excesso, a arquitetura pode ser exceção. E no luxo, exceção é sinônimo de valor.








sexta-feira, 30 de maio de 2025

“Thought for Humans.” O tema do Salão do móvel 2025 propõe o ser humano no centro da narrativa.

 Thought for Humans.”


O tema do Salão do móvel 2025 propõe o ser humano no centro da narrativa.


Alvaro Guillermo




Assim como venho escrevendo nos últimos artigos, o mundo tem reforçado a urgência de pensarmos mais na natureza – da qual fazemos parte e da qual dependemos para nossa sobrevivência. Aqui, cabe ressaltar a importância da arquitetura e do design como disciplinas voltadas para o futuro, permitindo ao público imaginar cenários por meio das propostas dos projetos. Quanto mais as imagens estiverem alinhadas com a natureza e o meio ambiente, mais fácil será para as pessoas entenderem que esses projetos visam proporcionar uma melhor qualidade de vida.

Thought for Humans.” (Pensamento para os Humanos.) é o tema da edição do Salone del Mobile 2025, que explorará as conexões profundamente enraizadas entre humanidade e design, luz e matéria. A proposta apresenta uma narrativa polifônica que consolida a primazia do evento como uma plataforma cultural e criativa.

O primeiro dos renomados curadores convidados a revelar um projeto extraordinariamente poderoso – criado especialmente para o Salone e graças a ele – é Robert Wilson, famoso designer de iluminação, reconhecido por sua abordagem inovadora ao integrar luz e diferentes formas artísticas. Ele retorna ao evento para criar uma nova "visão", intitulada Mãe, dentro de um espectro maior: Light is Life.

Com esse tema, o Salone del Mobile 2025 coloca os seres humanos no centro da narrativa e reafirma o design como um elemento essencial para aprimorar a qualidade da vida cotidiana. Sua campanha de marketing apresenta imagens evocativas que ilustram uma fusão harmoniosa entre formas humanas e materiais, evidenciando a profunda conexão entre o design e a experiência humana.

O fotógrafo responsável pelas imagens da campanha é Bill Durgin:
*"O trabalho fotográfico para este projeto foi concebido com atenção minuciosa aos detalhes, buscando capturar a essência da relação entre corpo, materiais e luz. Após anos de distanciamento físico, a nova campanha celebra o retorno ao toque, trazendo o foco de volta para a conexão entre o corpo humano e o design. A escolha dos materiais utilizados – madeira, metal, tecido e bioplástico – não é aleatória, mas profundamente alinhada aos valores do Salone del Mobile.

'Pensamento para Humanos.' é exatamente o que um ótimo design deve ser. Como seres humanos, estamos cercados por design todos os dias. Tudo ao nosso redor foi projetado por alguém, para alguém. Um grande design não é apenas esteticamente agradável – ele traz alegria às nossas interações diárias, seja ao nos movimentarmos pelos espaços, prepararmos o café da manhã, trabalharmos ou compartilharmos uma refeição em família. Ao projetar móveis, aprendi como os designers estudam o corpo humano, seus movimentos, habilidades e posturas, tudo para facilitar a vida. O design está enraizado na anatomia humana e se alimenta da interação contínua com ela.”*

Acompanhemos esse evento com esperança, pois Milão tem o poder de inspirar arquitetos e designers a repensarem seu próprio trabalho. O simples fato de estimular a reflexão já é, por si só, algo extremamente relevante.

Parabéns, Salone del Mobile 2025!


















Artigo publicado originalmente na revista MIXDesign 82

sábado, 30 de novembro de 2024

Inteligência artificial e o design de interiores

Inteligência artificial e o design de interiores

Alvaro Guillermo




Nestes últimos anos passamos a compreender melhor o significado da Inteligência Artificial (AI em inglês) e como convivemos com esta no nosso dia a dia. Está presente nos aplicativos que entendem como é nosso jeito de usuário, como Waze por exemplo que define rotas a partir de nosso jeito de conduzir, entre tantos outros.

Hoje com apps de AI estamos mais admirados ainda, como ChatGPT que está revolucionando a educação e colocando contra a parede inúmeras profissões.

Diante de todo este cenário o que podemos esperar num futuro próximo para nossas casas?

Uma dica já foi apresentada há 5 anos atrás pela Sony (em 2019) na semana de design de Milão. Por isso, quando visitamos a feira de Milão temos que ir com o olhar preparado para este tipo de análise, que é encontrar propostas para debater o futuro. Muitas vezes parecem absurdas ou distantes, mas, cinco anos passam muito rápido e é provável que em mais cinco anos algumas dessas propostas estejam em algumas casas.



O projeto nomeado Affinity in Autonomy , Afinidade na autonomia, propõe que a evolução dos objetos robóticos com AI será tão grande que nós seres humanos passaremos a ter afinidades por eles e vice-versa. Quando vivi essa experiência costumava dizer que esses robôs lembram minha border collie Gaia, que fica andando atras de mim pela casa toda, às vezes tenho que tomar cuidado para não bater com a porta nela.

Uma delas se baseia na iluminação, intitulada 'despertar', enfatiza como o aumento da consciência de nossos sentidos pode despertar um novo tipo de inteligência. Isto permite direcionar a luz de forma inesperada, a partir de uma inteligência. Se lembrarmos que hoje quando ligamos a luz parte de pontos fixos e aqui se propõe que a luz vai andar e direcionar feixes com livre arbítrio conforme a AI definir com a afinidade com o usuário.



Outra intitulada 'concordância', mostra que os objetos, como os humanos, terão suas próprias personalidades distintas. irão interagir, colaborar e agir de acordo com aqueles ao seu redor. no entanto, com movimentos imprevisíveis podendo até desencadear a formação de comunidades. Na mostra utilizaram cubos e esferas, mas imagine no futuro bancos, pufes, mesinhas andando pela casa, atrás dos usuários, ou fugindo deles. Sim! Porque tem pufe que não merece o dono. Bem se a Alexa já está no comando de sua casa, ou de seus projetos, comece imaginar como serão seus projetos para permitir toda esta afinidade e autonomia.




artigo publicado na MixDesign 79 em 2024








terça-feira, 12 de novembro de 2024

O futuro das cidades e as cidades do futuro.

Diante dos últimos desastres climáticos o mundo inteiro passou a entender a urgência de debater questões simples para a sobrevivência da espécie humana.

Isto parecia algo raro para o Brasil, a não ser pelas secas e incêndios recorrentes destas secas.

Mas as chuvas e alagamentos deste ano no Rio Grande do Sul demonstraram que temos muito mais com o que nos preocupar.

Algo que vem ocorrendo há muito tempo em várias cidades brasileiras, mas, que passado o evento climático é esquecido. Todo ano a cidade de São Paulo alaga com as chuvas de verão, a maioria esquece que São Paulo é uma cidade de rios (ver mapa), por baixo dessa cidade de asfalto e concreto existem milhares de córregos, riachos, rios e nascentes que emergem com as chuvas, que correm mais rápido pela cidade impermeável.


Rios da cidade de SãoPaulo



Balneário Camboriú em Santa Catarina, Olinda em recife e Fortaleza em Ceará, por exemplo, já não tem praias. As construções próximas à orla e a elevação do nível do mar tem acabado com a área de areia. Rio de janeiro registra frequentemente a invasão do mar nas avenidas da orla.

Santos não será diferente. Uma ilha com canais depende totalmente das marés oceânicas e da elevação do nível do mar.

Independente dos motivos, se trata de uma discussão longa, o certo é que nos últimos cem anos o nível do mar subiu 20 cm, crescimento que vem ocorrendo de forma exponencial, tendo a maior evolução de 2012 a 2023, ou seja, esta última década.

O importante neste momento é que arquitetos e designers se envolvam neste debate e apresentem ideias para retomar a pauta de uma visão de futuro das nossas cidades, que cidades gostaríamos de ter? Em que cidade gostaria de viver?

Precisamos desenvolver e disseminar pesquisas transdisciplinares focadas nas mudanças climáticas e bem-estar urbano social, cultural e espacial.

Cem anos atrás a visão de futuro eram cidades de concreto escuras e totalmente dependente das máquinas. Como mostra o filme Metrópoles de Fritz Lang ou a capa do livro Future Cities: Architecture and the Imagination de Paul Dobraszczyk. Será que acertou?


Fritz Lang. Film still from Metropolis. 1927 | MoMA


Future Cities: Architecture and the Imagination de Paul Dobraszczyk.



40 anos atrás a visão de futuro era de cidades tecnológicas, a alta tecnologia moldando o urbano. É isso que estamos vivendo?

E hoje, como vemos as cidades no futuro? Como você imagina que seria o futuro ideal de nossas cidades?

Muitos estudiosos estão apostando em cidades focadas no ser humano e na natureza, ou seja, sustentáveis.

Saímos da mata e do rural, com medo da solidão na natureza (fauna e flora) para viver em locais que passamos a chamar de urbes, polis, cidade, urbano. E em muito pouco tempo percebemos que o extremo não foi uma boa solução. Temos que alterar o foco com urgência, iniciando o quanto antes esta mudança. Principalmente porque a Natureza segue a ordem analógica do tempo certo de crescimento. Para termos árvores no futuro, precisamos começar o plantio já. Para termos águas limpas no futuro, precisamos tratar e cuidar da nascente já.

Repare na linha do tempo qual você escolhe?





artigo publicado na Revista MIXDesign 78